sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

VÁRIOS passarinhos me contaram...

Há uns dias atrás estava eu no meu twitter, fazendo nada, e daí me deu um estalo: vou postar algo sobre cultura cristã. Afinal, estava na hora de fazer algo útil com o twitter certo? E posto os seguintes 280 caracteres:

Crente é contra casas monitoradas,fazendas fake e dramalhões televisionados.
Mas e aí?A solução é o quê? Entupir a tv de prog evangelistico?
Entendam: crentes se afirmam como grupo à parte, porém ñ produz cultura
própria em qte e qualidade a ponto d efetivarem essa "separação".


Rapidamente obtive a resposta de duas pessoas amigas, conhecidas de fora da rede, Katherine e Karla. (Não só delas…) Não chegamos a realmente nos alongar porque postei os 280 caracteres da discórdia e fui dormir, vendo o resultado só no outro dia. Aliás, cheguei a twittar algo sobre isso, do gênero “não bote fogo no circo e vá dormir”.


O que eu quis dizer afinal de contas?


Eu respondo essa pergunta, de uma forma ou de outra, em todos os posts daqui e em outros lugares também. Vou tentar explicar o que estava na minha cabeça naquele momento. Esclarecimento, a cultura é, grosso modo, o conjunto de práticas, modos de agir, pensar e sentir de um povo ou de uma comunidade de pessoas. Essas pessoas dão sentido a tudo que lhes cerca utilizando as ferramentas oferecidas pela cultura. Você só sabe que o sinal vermelho significa PARE porque alguém lhe disse. Sacou? É por aí.


Como um grupo social que se propõe ser separado do convívio social comum, um grupo santificado, os crentes geram essas ferramentas de formas diferentes das outras pessoas. Isso possibilita que os crentes (seu tipo ideal, ou seja, o “estereótipo” do crente, seja o “assembleiano”, seja o “gospel”) sejam identificados como tal por qualquer um da sociedade na qual estão inseridos, inclusive outros crentes (essa é a explicação sociológica, digamos assim, para a história do “crente conhece crente”). É claro, portanto, que os crentes produzem cultura própria, como qualquer outro grupo social.


O que eu disse naqueles infames 280 caracteres trabalhava com o seguinte raciocínio: SE o grupo social “crentes” intitula-se separado da sociedade (chamada de “mundo”) porque apropriarem-se dos veículos culturais deste mesmo “mundo” para seus próprios fins? Fazendo isto o que se terá é uma dissolução progressiva da “barreira cultural” entre crentes e não-crentes. O “nós e eles”, esse mundinho preto-e-branco que o religioso/gospel tipo puro adora, se autodestrói.


O ponto aqui não é o que penso disso. O ponto é a contradição.


A cultura cristã, na verdade, a cultura gospel, tem tentado resolver essa tensão que é própria do pensamento religioso com vários expedientes, entre eles a teologia do domínio e a quebra do ascetismo cultural do pentecostal clássico (agradeça a Renascer por agora todos podermos louvar a Deus com rock! Yeah!). Esses esforços têm trazido mais membros para as igrejas, porém cristãos mais tradicionais, além da intelligentsia pentecostal, se mostram apreensivos e críticos a tudo isso. A maneira como se processa a conversão e manutenção do fiel é vista ora como positiva, ora como negativa. Contradição.


O “problema” não é a contradição. A contradição é parte da “solução”; considerando que haja um problema solucionável aqui e se adotarmos a lógica aristotélica do terceiro excluído (ou é isto, ou é aquilo). O “problema” é o não-reconhecimento da contradição inerente à vida do ser humano e à vida do cristão. Deus não pode e não vai dar todas as respostas ou todas as bênçãos que pedimos/ordenamos/reivindicamos, Deus não pode e não vai ser explicado totalmente por pastor/apóstolo/bispo/leigo/semideus nenhum! Simplesmente não entendo porque o gospel/religioso/fariseu não consegue entender isso - mentira, eu sei, mas não vou dizer.


A “solução” também não é “se assentar na roda dos escarnecedores”[1]. Afinal, se ainda se pretende professar uma religião que não é a da maioria, viva-se com isso ou larga isso duma vez! Como cheguei a responder no outro dia, isso não é sobre testemunho cristão (já pontuei umas coisinhas aqui e aqui, pretendo voltar a isso em outra oportunidade), isso é “entender” a contradição e fazer algo sobre isso; não simplesmente reproduzir o sistema religioso, saber que a Verdade não pode ser contida com nossas mãos e que no espaço não há dia nem noite, apenas o espaço que rasgamos com luz… Claro que isso reflete em toda a vida de uma pessoa, saber que o fato de eu ter “Jesus no coração” não me torna melhor que ninguém, (muitíssimo) grosso modo, que eu sou humano como qualquer um e tudo que posso dizer de outras religiões podem dizer da minha — e daí decidir o que fazer com isso, permanecer ou pular no oceano da fé, etc e tal.


O salmista disse que era bem-aventurado o homem que não se assentava na roda dos escarnecedores. Mas Jesus comia com publicanos e pecadores… e aí? Contradição. A "harmonia da imperfeição".


Bem… chega por enquanto!


Condensar vários pensamentos em 280 caracteres dá nisso: dezenas de twetts de pessoas tentando entender o que você disse (ou pior: achando que entenderam e falando em cima desse entendimento) e um post de — até agora — 954 palavras, ops, 955 palavras, ops…(Já parei de contar, alterei muita coisa depois de tirei ele do Word)

Espero pelo menos ter começado a explicar. Ou melhor, construir algo junto.

___________________

[1] No sentido do ascetismo gospel, o "eu sou melhor que vocês" e coisas correlatas.

5 comentários:

Gil Costa disse...

Eu to meio viciado em BBB 10, contrariando todas as minhas expectativas.

Adoro futilidade!

E não entro no twitter por isso. Não consigo condensar nada.

Sobre teu comentário lá no blog, já está (in)devidamente respondido.

Abraço!

Alexandre Ataíde disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Alexandre Ataíde disse...

Adorei a explanação. Bom, talvez por ser eu amigo isso acabe, soando como "puxassaquismo", porém não é nenhum pouco (cabe a quem julgar, lembrar das palavras de Jesus, que nos diz que não somos juízes de nada nesse mundo...), mas é realmente, o que penso. Não vou me alongar. O que vejo, é um tempo de confusão certamente, entender a bíblia hoje, e o que é pior, acha-se dono da melhor interpretação e nos piores casos, dono da verdade é complicado. Mais um ponto importante, e que é fato, é que a cultura cristã em especial a protestante, ainda precisa melhor afirma seus e definir seus "ritos" ou “carimbos” se quiser entrar nessa discussão de uma maneira mais encorpada. É melhor também, ir assumindo, que por muitas vezes se mistura sim, ao que considera “do mundo”. De uma forma sutil, é verdade, mas mistura-se sim. Talvez por isso, a igreja seja até mais agressiva e contraditória, pelos simples fato de ser algo de demandado por Deus, ou pelo famosa condição religiosa.

Bom, acho que o povo crente adora construir o que é, e não é pecado.Isso muitas vezes parte de um juízo isolado, o que considero muito perigoso e preconceituoso. Até porque, essas muitas vezes não considera-se pecado, só pelo fato de ser um estado de necessidade de cunho religioso e singular, a retórica do líder, muitas vezes da conta de simplesmente mudar, canoniza, ou melhor, de transformar de maneira mágica a ocasião, outras vezes considerada pecaminosa quando incorporada em contexto semelhante(as vezes, comparo isso a mercado capitalista msm, ao marketing). Agora me diga como uma coisa dessas? Brincadeira!
Já presencie cenas clássicas, onde mesmas idéias ganham conotações diferentes, instantaneamente viram ou deixam de ser pecado. Às vezes depende apenas de quem está a frente, para ser ou não pecado, para ser ou não de deus, para da certo e não da certo. É MUITO NATURAL NA MINHA OPINIÃO, ALGUMA COISA DÁ OU NÃO CERTO, ISSO TMB É ESPIRITUALIZADO, QUANDO CONVENIENTE...
Acho que primeiro de tudo, precisa-se, ser mais verdadeiro e mais crítico consigo, isso é uma realidade não só do crente, mas do ser humano, é macro. Fala-se muito que religião não muda ninguém, e de fato, isso é uma verdade. Porém, a primeira coisa que matutamos na nossa cabeça, é o convite para uma visita a "sede de Deus" na terra. Não nos damos conta que preparamos iscas, emboscadas, tratamos como ratos pessoas, não que seja ruim anunciar a fé, porém é bom reavaliarmos sempre posturas.
Somos covardes de mais, para falar e não perceber o que de fato estamos anunciando. As vezes acho que falamos do evangelho por pura moda, por mera tendência, porque estamos sendo doutrinados, criados dentro de laboratórios religiosos. Isso é muito perigoso!
Psicologicamente falando, olhar é bem diferente do verbo observa, esse ultimo é mais abrangente, mais poderoso.

*Acredito é que muito crente tem que deixar de ser chato, e procurar entender melhor, e com mais bom senso sobre esclarecimentos plurais. Depois dizem, que nós é que somos díficies de decifrar, ou que somos estranhos demais. Apenas Deus é uma coisa que escolhemos descubrir aos poucos, e isso pode ser somente um estado. Não tem receita, essa é a verdade, a vida é diferente para todo mundo, tem contextos diferentes em muitas circunstancias... Não dá para nos deixar sem experiência perigos e vales, não se pode ter esse desejado controle em nome de uma pseudo proteção. Os erros também ensinam, nos amadurecem, melhor nos adaptam para vida. Nossos pais erraram, e não são os melhor ou piores seres humanos do mundo.
(...)

Gil Costa disse...

Caraca Alexandre, esse foi o maior comentário em blog que eu já li! Deve ser até maior que a postagem do Rob! kkkkkkkkkkkkk!

O q já percebi é q todo mundo adora umas respostas prontas, uma receita de bolo pra viver a vida. Mas Deus, ao invés de enviar 95 dogmas, enviou Jesus Cristo. Como não conseguimos fazer nada do que Cristo ensinou, então inventamos religiões, doutrinas, congregações etc.

Simples assim. [:D]

Tá bom, eu generalizei MUITO. Mas deve ser mais ou menos por aí...

Aline Ramos disse...

É, Gil, acho que você generalizou "um pouquinho", mas tbm acho que é nesse rumo mesmo! =P O problema é que o homem quer entender tudo, quer se tornar o dono da verdade, e (problema) usa sua mente falha, errônea, finita para chegar a esse ponto. E cria suas regras, doutrinas, religiosidades, de acordo com suas interpretações da Verdade. Grande problema. Estou aprendendo muito a esse respeito. A duvidar mais, questionar mais, e acreditar de forma menos "orgulhosa" nas "verdades" que acho que já tenho! Tenho aprendido que o início do crescimento é entender que você não sabe tudo, e que é bobagem acreditar que saberá TUDO, e se permitir por em cheque "suas próprias verdades". Deixar que Deus seja o Deus, e não você!

É isso aí! Ótimo texto, Rob! :)