segunda-feira, 12 de abril de 2010

Sobre o homem "3 em 1" e seus Louboutin

Já pararam pra pensar na tricotomia do ser humano?

Claro que não - eu duvido MUITO! - Não desse jeito, mas... vamos por partes?

Os cristãos (com notáveis exceções, mas aqui eu me refiro especificamente aos pentecostais e neopentecostais em geral) acreditam que o ser humano possui alma, corpo e espírito. Ou como se diz por aí, "somos espírito que possui uma alma e habita em um corpo". Certo. O discurso de santificação prega que devemos alimentar o espírito e mortificar o corpo e (no mínimo) ignorar a alma.

Permissão pra ser (levemente) didático?

O corpo corresponde não somente à carnalidade (e daí aos pecados de natureza sexual; lascívia, adultérios e outros), mas também às coisas mundanas e/ou seculares. A esta vida, portanto, em sua acepção mais material (portanto vil) possível. Isso é a pincelada, desde a Idade Média muita coisa mudou sim, apesar das críticas externas dos ateístas pitbulls de Dawkins e outros detratores dos quais não me ocuparei agora.

A alma corresponde às emoções e sentimentos, sejam eles bons ou ruins. A alma não é considerada pecaminosa em si, ao contrário do corpo no cristianismo do período medieval (e até hoje na mentalidade católica popular de inspiração monástica - reportem-se às representações e imagens populares do "santo" popular católico), porém é coisa humana e como coisa humana deve ser tratada com cuidado - isso é coisa "recente", talvez (ei, não sou tão bom de teologia assim!) a coisa comece com Scheleimacher e sua teologia do sentimento. O que importa é que o evangelicalismo do pós-guerra nos EUA é o apogeu desse ponto, do hedonismo cristão; antes era moer a alma e dane-se. Portanto, a alma é nossa humanidade.

O espírito é a "parte" de nós (uso aspas porque nessas coisas sempre usa-se figuras de linguagem e coisas assim. Não somos armários nem temos closets cheios de sapatos Louboutin dentro da gente né?) que está em maior contato com Deus e as coisas da esfera espiritual - eu sei, há quem diga que enxergar o Universo dividido entre matéria e espírito é uma tremenda afronta à cosmovisão hebraica e à própria doutrina cristã. Por enquanto vamos botar o parêntesis nisso, apesar dessa discussão ser FUNDAMENTAL pra montar um "mapa cartográfico" pras coisas que digo aqui e ali.

E aí? Qual é a da aulinha? Bom, o que acontece é que atualmente na igreja evangélica busca-se a santidade (ou a santificação, depende como você enxerga o processo, ou se é um processo pra você) pelo silenciamento da alma. Quê?

Explico, ou melhor, vou tentar fazer isso: Acredita-se que seguir cegamente as orientações e os hábitos dos seguidores que estão lá antes de seu ingresso na religião cristã vai tornar você mais santo. Não porque se acredite que a santidade se pegue como gripe, mas porque acredita-se na "força da comunhão" como fator socializante e normativo sobre comportamentos específicos. E olha, isso até que é bom - POR UM TEMPO.

****SEGURA QUE AGORA COMEÇOU!!!****

Contudo esquecemos que a obra de Cristo objetiva reconciliar-nos com o Pai e conosco - "para que todos sejam um", "pois tendes o ministério da reconciliação", lembra? Tal obra não devia alienar-nos de nós ou do Outro (a pessoa, o irmão, o necessitado, o pecador lato sensu - e o stricto sensu também, leia-se drogados, prostitutas baratas, mendigos etc), antes reunir-nos Nele e nesta união mudarmos o mundo ao nosso redor?

Iniciativas existem? Claro! Elas são disseminadas? NEM PODERIAM SER! Como seriam se o evangélico não quer sofrer - mesmo que o sofrimento seja uma excelente escola, pra dizer o mínimo -, se o cristão mediano desconhece o REAL significado do martírio (e o associa somente à morte física) e o neopentecostal é educado a tratar todo infortúnio como vindo de Zoroastro/Diabo/Belzebu/Coloque-o-nome-do-deus-do-mal-genérico-aqui? Temos (percebam a ordem da pessoa que o verbo se refere! Percebam a intenção por trás disso) que ser vencedores, santos, puros, imaculados, pacientes, bondosos, planar acima de tudo isso - e de certo modo temos mesmo. Porém a Força propulsora não advém de nós! Isso é destruir a Graça! Somos santos porque somos santificados! Somos justos porque somos justificados! Nossa vida é testemunho de algo que JÁ possuímos/somos, não a fútil tentativa de comprar bilhete de metrô pro céu.

O sistema religioso não privilegia a rede social, a microssocialidade, o comunal. Ele o engole (a palavra acadêmica é subsumido, caso você esteja querendo saber) e mata. Quando não o consegue, o transforma em mecanismo de replicação do sistema, matando a principal função da vida - reprodução em seu próprio ritmo. Câncer é o nome pessoas! Câncer!

Que cruz é essa que aponta morte e não vida? Que "ministério da reconciliação" é esse que só traz sofrimento, desespero e alienação? Responder algo como "mas esse NÃO é o Evangelho!" é só o começo do problema. Qual é então esse Evangelho? Qual o(s) caminho(s) a seguir (nein! Eu SEI que Jesus é o caminho. Eu tô falando de prática de vida! Caráter! Atitudes concretas e reais!)? A resposta passa, em minha concepção, pelo despir-se dessa linguagem gospelizada que obscurece e escamoteia nossas falhas em viver a Vida. Não podemos confundir aceitação pelo meio social com santificação pessoal (e nem o oposto: nem todo outsider é profeta, nem todo bom orador é um evangelista).

Respostas definitivas não me cabem. Somente pontos-de-vista. Se eles estão corretos ou não, cabe a você me dizer (preferencialmente por quê). Certo?

Boa matutada nesse calhamaço agora!
Até!