Crente é contra casas monitoradas,fazendas fake e dramalhões televisionados.
Mas e aí?A solução é o quê? Entupir a tv de prog evangelistico?
Entendam: crentes se afirmam como grupo à parte, porém ñ produz cultura
própria em qte e qualidade a ponto d efetivarem essa "separação".
Rapidamente obtive a resposta de duas pessoas amigas, conhecidas de fora da rede, Katherine e Karla. (Não só delas…) Não chegamos a realmente nos alongar porque postei os 280 caracteres da discórdia e fui dormir, vendo o resultado só no outro dia. Aliás, cheguei a twittar algo sobre isso, do gênero “não bote fogo no circo e vá dormir”.
O que eu quis dizer afinal de contas?
Eu respondo essa pergunta, de uma forma ou de outra, em todos os posts daqui e em outros lugares também. Vou tentar explicar o que estava na minha cabeça naquele momento. Esclarecimento, a cultura é, grosso modo, o conjunto de práticas, modos de agir, pensar e sentir de um povo ou de uma comunidade de pessoas. Essas pessoas dão sentido a tudo que lhes cerca utilizando as ferramentas oferecidas pela cultura. Você só sabe que o sinal vermelho significa PARE porque alguém lhe disse. Sacou? É por aí.
Como um grupo social que se propõe ser separado do convívio social comum, um grupo santificado, os crentes geram essas ferramentas de formas diferentes das outras pessoas. Isso possibilita que os crentes (seu tipo ideal, ou seja, o “estereótipo” do crente, seja o “assembleiano”, seja o “gospel”) sejam identificados como tal por qualquer um da sociedade na qual estão inseridos, inclusive outros crentes (essa é a explicação sociológica, digamos assim, para a história do “crente conhece crente”). É claro, portanto, que os crentes produzem cultura própria, como qualquer outro grupo social.
O que eu disse naqueles infames 280 caracteres trabalhava com o seguinte raciocínio: SE o grupo social “crentes” intitula-se separado da sociedade (chamada de “mundo”) porque apropriarem-se dos veículos culturais deste mesmo “mundo” para seus próprios fins? Fazendo isto o que se terá é uma dissolução progressiva da “barreira cultural” entre crentes e não-crentes. O “nós e eles”, esse mundinho preto-e-branco que o religioso/gospel tipo puro adora, se autodestrói.
O ponto aqui não é o que penso disso. O ponto é a contradição.
A cultura cristã, na verdade, a cultura gospel, tem tentado resolver essa tensão que é própria do pensamento religioso com vários expedientes, entre eles a teologia do domínio e a quebra do ascetismo cultural do pentecostal clássico (agradeça a Renascer por agora todos podermos louvar a Deus com rock! Yeah!). Esses esforços têm trazido mais membros para as igrejas, porém cristãos mais tradicionais, além da intelligentsia pentecostal, se mostram apreensivos e críticos a tudo isso. A maneira como se processa a conversão e manutenção do fiel é vista ora como positiva, ora como negativa. Contradição.
O “problema” não é a contradição. A contradição é parte da “solução”; considerando que haja um problema solucionável aqui e se adotarmos a lógica aristotélica do terceiro excluído (ou é isto, ou é aquilo). O “problema” é o não-reconhecimento da contradição inerente à vida do ser humano e à vida do cristão. Deus não pode e não vai dar todas as respostas ou todas as bênçãos que pedimos/ordenamos/reivindicamos, Deus não pode e não vai ser explicado totalmente por pastor/apóstolo/bispo/leigo/semideus nenhum! Simplesmente não entendo porque o gospel/religioso/fariseu não consegue entender isso - mentira, eu sei, mas não vou dizer.
A “solução” também não é “se assentar na roda dos escarnecedores”[1]. Afinal, se ainda se pretende professar uma religião que não é a da maioria, viva-se com isso ou larga isso duma vez! Como cheguei a responder no outro dia, isso não é sobre testemunho cristão (já pontuei umas coisinhas aqui e aqui, pretendo voltar a isso em outra oportunidade), isso é “entender” a contradição e fazer algo sobre isso; não simplesmente reproduzir o sistema religioso, saber que a Verdade não pode ser contida com nossas mãos e que no espaço não há dia nem noite, apenas o espaço que rasgamos com luz… Claro que isso reflete em toda a vida de uma pessoa, saber que o fato de eu ter “Jesus no coração” não me torna melhor que ninguém, (muitíssimo) grosso modo, que eu sou humano como qualquer um e tudo que posso dizer de outras religiões podem dizer da minha — e daí decidir o que fazer com isso, permanecer ou pular no oceano da fé, etc e tal.
O salmista disse que era bem-aventurado o homem que não se assentava na roda dos escarnecedores. Mas Jesus comia com publicanos e pecadores… e aí? Contradição. A "harmonia da imperfeição".
Bem… chega por enquanto!
Condensar vários pensamentos em 280 caracteres dá nisso: dezenas de twetts de pessoas tentando entender o que você disse (ou pior: achando que entenderam e falando em cima desse entendimento) e um post de — até agora — 954 palavras, ops, 955 palavras, ops…(Já parei de contar, alterei muita coisa depois de tirei ele do Word)
Espero pelo menos ter começado a explicar. Ou melhor, construir algo junto.
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[1] No sentido do ascetismo gospel, o "eu sou melhor que vocês" e coisas correlatas.